Acho que é bastante importante a gente entender que existem basicamente três vozes. Uma voz é a dessa mulher que está sentada diante da lente, conversando com o público, dizendo "eu vou contar o que me aconteceu". A outra mulher é a da mulher que estava no dia anterior, no apartamento, vivendo a situação que essa primeira vai narrar. Então, ela é que estava tomando café da manhã, fumando um cigarro, ela que entra no quarto e encontra a barata. E aí a gente tem uma terceira instância que é a da memória, das coisas que ela viveu, dos vários momentos de sua vida, das pessoas que ela encontrou, das festas e recepções que deu na própria casa, do aborto que ela fez, do homem com quem talvez ela tenha se casado. Essa divisão ajudou muito a gente, não só a mim, mas a direção e a equipe, a situar a personagem, a estabelecer uma textura diferente para cada uma dessas vozes.
Qual foi a parte mais difícil na realização do filme?
Não acho que exista uma parte mais difícil, acho que esse filme foi todo um grande desafio enfrentado com muita coragem e com muita confiança, uns nos outros, dentro dessa equipe. Muita confiança minha no Luiz, dele em mim, e em todos os que estavam no set. Trabalhamos com muita paixão e muita entrega, e procurei oferecer tudo o que eu tinha para que o filme se realizasse da maneira que o Luiz sonhava.
A Paixão Segundo G.H. foi publicado 60 anos atrás. O que a personagem, suas reflexões, suas angústias e seus anseios ainda dizem para e sobre a mulher dos nossos tempos?
O livro foi escrito 60 anos atrás, mas, na minha opinião, é extremamente atual, poderia ter sido escrito ontem. Percebo que as mulheres se identificam de uma maneira ou outra com as reflexões, as angústias, os anseios. Isso, 60 anos depois, não mudou. Ainda estamos falando desses mesmos assuntos. Talvez hoje a gente esteja falando mais sobre isso, isso sim, estamos discutindo. Mas a situação em si da mulher e as lutas que ela precisa travar no seu cotidiano ainda são as mesmas.