
Caxienses na faixa dos 40 anos de idade que foram operados na infância, em hospitais como o Pompéia e o Virvi Ramos, provavelmente aram pelas mãos do cirurgião pediátrico João Carlos Virgili Costa. Isso porque ele era um dos poucos especialistas que atuavam no município naquela época. Aos 73 anos, o profissional — que também atendeu as gerações seguintes como clínico geral, em consultório, e foi vereador titular por duas legislaturas — entrou para as estatísticas de Caxias do Sul como mais uma vítima da covid-19 em 2020.
Sem velório, uma cerimônia de cremação ocorreu na manhã desta terça-feira (29), no Memorial Crematório São José. O luto é compartilhado com amigos, pacientes, médicos, políticos e muitos outros moradores que acompanharam sua trajetória e reconhecem o legado por ele deixado à cidade.
— Ele sempre foi muito presente na vida social de Caxias. Um médico que olhou de uma forma diferente para a medicina, sabendo da importância e do potencial de mudar a sociedade através dela — relata um de seus quatro filhos, Mauricio Rosa Costa, 40.
Virgili Costa morreu na segunda-feira (28), após completar cinco semanas de internação no Hospital da Unimed. De acordo com Maurício, a internação se deu para um procedimento cardíaco eletivo e o pai chegou a ir para o quarto de recuperação. Ao contrair a covid-19, porém, ele acabou retornando à Unidade de Terapia Intensiva (UTI), onde permaneceu durante três semanas.
— Ele baixou para tratar da insuficiência cardíaca e acreditamos que a covid foi uma fatalidade. Sempre foi muito bem tratado no Hospital da Unimed e não temos nenhum tipo de reclamação da conduta adotada por eles. Nas últimas semanas elaboramos o luto porque a perspectiva de melhora era muito pequena e a qualidade de vida dele, com certeza, não seria a mesma — comenta o filho.
Quem foi Virgili Costa
Natural de Itaqui — município gaúcho que fica na fronteira com a Argentina —, Virgili Costa formou-se médico em Santa Maria, chegando a especializar-se, posteriormente, no Rio de Janeiro e na Bélgica. Ainda na região da Fronteira conheceu a mulher, a professora Marinice, com quem mudou-se para Caxias do Sul na década de 1970 para trabalhar no Hospital Virvi Ramos.
A família aumentou com a chegada dos filhos Marcelo, Mariele, Maurício e Leonel, sendo o caçula batizado em homenagem ao político Leonel de Moura Brizola do Partido Democrático Trabalhista (PDT), sigla pela qual Virgili Costa foi eleito vereador por duas vezes como titular (em 1996 e 2012), atuando também como suplente entre 2009 e 2012, na Câmara Municipal de Caxias do Sul.
— Ele sempre foi um cara idealista e começou a deixar um pouco de lado a cirurgia porque achava que tinha a função de ser político. Sempre foi brizolista e gostava muito de política, estimulava as pessoas a debaterem política em uma época na qual não era comum se falar sobre isso — relata Maurício.
Em seus mandatos como vereador, o médico priorizou a saúde, sendo um dos idealizadores do primeiro Postão (Pronto Atendimento 24h) de Caxias do Sul. Como legislador, também levantou a bandeira em defesa dos direitos da pessoa idosa, sendo o autor da Lei que instituiu o Dia Municipal de Conscientização da Violência contra o Idoso, que acompanha a data mundial, celebrada em 15 de junho.
Em 2016, Dr. Virgili, como era conhecido, não concorreu novamente e decidiu voltar a dedicar-se exclusivamente ao consultório, onde atendia como clínico-geral. Mesmo durante a pandemia, fez questão de manter os atendimentos, apenas com uma redução de horários, entendendo a importância do trabalho como profissional da saúde neste momento.
Pelos filhos é lembrado com um pai presente, que sempre respeitou e apoiou os sonhos de cada um, transformando a casa em um "porto seguro" a ser revisitado sempre que necessário. De acordo com Maurício, até o ano ado, ele ainda mantinha o costume de encontrar amigos às sextas-feiras para partidas de futebol e confraternizações. Além de manter a forma, ele também era usuário de redes sociais, ficando eternizado, agora, pela definição autobiográfica deixada em seu perfil do Twitter: "Goleador de mal com o gol, escritor de bem com a falta de criatividade, político às voltas com a contradição, médico com dó da natureza".