
Em um monumento instalado em frente à praça central de Nova Roma do Sul, na Serra, onde estão listadas todas as 645 famílias que colonizaram o município, sobrenomes italianos se misturam aos de poloneses.
São grafias carregadas de consoantes que lembram que as terras costeadas pelo Rio das Antas foram também povoadas por polacos. Depois de 150 anos da vinda dos primeiros deles, os descendentes da quarta e até da quinta geração agora lutam para manter a cultura viva.
A data exata de chegada do povo que saiu de terras na época dominadas por russos é imprecisa, mas remete ao mesmo ano da vinda dos primeiros colonizadores italianos, em 1875.
Na época, encontraram nas terras devolutas do império um terreno montanhoso ao qual não eram acostumados. Além disso, como o escritor Iraci Marin intitulou um de seus livros, eram “Imigrantes poloneses afundados em um mar italiano”.
— Entre 1889 e 1894 vieram mais de 60 mil poloneses ao Brasil, que saíram de regiões ocupadas pela Rússia, e sofreram o que não esperavam sofrer. Fugiram, na expressão do Frei Stawinski, da opressão dos usurpadores de suas terras, com o sentimento dolorido de saber que seu país não existia. Não bastasse isso, no novo mundo eram chamados de polacos sem bandeira, e a expressão doía. Alguns escondiam, ou não diziam o sobrenome polonês, para não serem alvo de gracinhas — conta.

Ainda de acordo com Marin, na Serra os poloneses foram, principalmente, destinados para sobras de terras, muito próximas aos rios das Antas, São Marcos, Carreiro e da Prata. Quem dá início à linha do tempo da imigração polonesa, por exemplo, são as 26 famílias que receberam terras na Linha Azevedo Castro, em Carlos Barbosa, às margens do Arroio Boa Vista.
Mais tarde o escritor bento-gonçalvense Vitor Inácio Kozowski viria descrever os locais como “Vale de Lágrimas”, por conta do isolamento e das dificuldades encontradas pelos imigrantes.
— Viviam isolados, distantes entre si, torturados de saudades. As propriedades, além de distantes, eram pequenas, geralmente em espaços acidentados, com difícil trato da terra e, principalmente por essa razão, vários núcleos coloniais fracassaram — descreve Marin.
As terras ocupadas por poloneses na Serra estão evidenciadas pelo monumento organizado pela Secretaria de Turismo de Nova Roma do Sul. Em formato de octógono, cada um dos lados representa uma das oito linhas colonizadas por imigrantes. Nas linhas Carlos Leopoldo, Fagundes Varela e Castro Alves está a maioria das 200 famílias polonesas instaladas no município e nomeadas pelo livro Povoadores de Antônio Prado, de Rovilio Costa.

Núcleos resgatam tradições
Em 2008, em campanha para se tornar vereador, Zelvir Santi ouvia nas comunidades algo comum entre tantos descendentes de poloneses em Nova Roma do Sul. Era a necessidade de um encontro, uma reunião entre eles para que a história não fosse esquecida. No mesmo ano, em dezembro, surgiu no município o núcleo da Braspol, que promove anualmente no município um jantar típico e que viabilizou em uma praça da cidade um capitel em homenagem ao papa João Paulo II, polonês e orgulho dos descendentes.
— Os polacos estão por todos os lados de Nova Roma e sentiam falta de uma associação que os reunisse e promovesse encontros. Como havia na maioria italianos no ado, os povos se misturaram, mas a cultura que predominou foi a italiana — diz Zelvir.
Diferentemente do Talian, língua cooficial de 30 municípios gaúchos, e inclusive adotado por polacos como Alcides Zoraski, presidente da Braspol em Nova Roma, o polonês é pouco falado na Serra.
— Meu pai tentou me ensinar quando criança, mas eu não levava a sério, ele ficou bravo e desistiu. Me arrependo, a cultura italiana da mãe prevaleceu, mas quando o papa João Paulo II foi eleito senti orgulho e ei a estudar minhas origens, fui para a Polônia em 2014 e foi o dinheiro mais bem gasto da minha vida — conta Zoraski.

Carpinteiro, Zoraski já produziu em madeira mais de mil pisankis, os tradicionais ovos ornamentados que carregam simbologia e a cultura polaca. Devoto de João Paulo II, é dele o desenho do capitel com a imagem do Santo Padre, feito com características da cultura polonesa e que se tornou um símbolo de uma cidade colonizada também por poloneses.
No interior, uma família carrega o sobrenome polaco ao lado do italiano, algo comum na comunidade. São os Giaboenskis, descendentes de Anastácio Giaboenski, que no ado produzia espingardas em um galpão nos fundos da propriedade.
A nora, Gema Bunai Giaboensi, 89 anos, lembra da personalidade do sogro e do marido, que se adaptaram à região em meio aos italianos:
— Não se entendia nada do que falavam e era difícil aprender. São mais teimosos que os italianos, mas mais calmos e pacíficos.
O município de Nova Prata sedia até o domingo (4) o Festival de Cultura Polonesa no Brasil. O evento ocorre no Salão Paroquial (Av. Fernando Luzzatto, 64) com almoços, jantares e apresentações folclóricas. No domingo (5), às 10h30min, famílias de origem polonesa vão desfilar com trajes típicos pelas ruas de Nova Prata.